Bengaladas!


Sim, umas boas bengaladas é o que a FNAC precisa nesta sua última campanha de homofónica pobreza e que tem gasto tanta largura de banda no Facebook. A revolta vem acima de tudo do facto de se trocar um bom dum Eça por uma sempre pobre escrita Anglo-Saxónica. Esta troca, ou trocadilho, de palavras e produtos é de um mau gosto inenarrável mas não é tudo, pois apresenta duas caras da mesma desvalorizada moeda: a primeira a de uma instituição que vende produtos mediáticos e não tem um mínimo de cultura para mostar aquilo que faz e a segunda, a de um público consumista, que se deixa ficar pela superfície de um vácuo slogan, numa boçalidade genética que até hoje não compreende ou ignora o que é cultura ou propriedade intelectual, talvez porque ambas (reitero cultura e intelecto) estejam permanentemente obliteradas.

A base do problema da campanha de trocas da FNAC é acima de tudo a sua ilegalidade e fundamenta-se na pura ignorância tanto da FNAC como dos potenciais “beneficiados” desta acção.

Já vi escritos os maiores disparates em relação a Direitos de Autor, domínio público e trocas e baldrocas. Está-se a fugir ao fulcro do problema e que consiste no acto de compra de um produto, mediático ou não, imbuído de qualquer actividade intelectual. Se os meus amigos leram livros em inglês, ou pesquisam a letra pequena de CDs e todos os trailers de DVDs estas palavras são sempre recorrentes:

This book is sold subject to the condition that it shall not, by the way of trade or otherwise, be lent, resold, hired out, or otherwise circulated without the author’s prior consent in any form of binding or cover other than that in which it was published and without a similar condition including this condition being imposed on the subsequent publisher.

O que significa isto? Simplesmente... um contracto instantâneo. Quando se compra um livro, o princípio inerente é que é pessoal e intransmissível para o recipiente final (se for oferta, não reoferta!), ou seja cria-se um ambiente de posse e respeito pela obra que nos é dada ler, da maneira que o autor pretende e com a visão que o editor definiu. Isto aplica-se a tudo, cinema, música, pintura, fotografia, software, todo o produto que chega até nós e que não teria existência se não houvesse imaginação, intelecto, Humanidade. Não pode ser vendido, emprestado ou alugado sem autorização prévia do editor e/ou autor. O problema nacional é que há uma mentalidade borlista que permeia toda a sociedade, numa falta de respeito e educação pela propriedade intelectual que é verdadeiramente indescritível. E inventam-se desculpas para se cometerem constantes actos singulares de pirataria que não deveriam ter lugar numa sociedade baptizada de “moderna”. Empresas como a Microsoft e Adobe tentam a todo o custo não serem roubadas do investimento e investigação que fizeram, mas a quantidade de software ilegal que corre nos computadores nacionais é lendária. Utilizam-se argumentos de “a Microsoft já tem muito dinheiro não precisa do meu” e outras frases bacocas e ignorantes. Fazem-se cópias e downloads de música e cinema completamente ilegais, utilizam-se fotos e outras formas de arte roubadas de alguém que teve o intelecto para as fazer, borlas, bórliú.

Vi escrito que “Os Maias” são agora “domínio público” e por isso é fartar vilanagem! Mais ignorância... o que é domínio público é aquilo que o Eça escreveu e pode ser lido por exemplo aqui! O que é ilegal é fotocopiar ou imprimir estas páginas deste PDF e distribuí-las sem rei nem roque.

Um livro é mais do que um texto de um autor, é trabalho de pesquisa, edição, formatação, revisão, tem muitas vezes notas do editor ou prefácios de outrém, tem imagens ou fotos em capa e contracapa que alguém fez e pensou. Este trabalho todo é também propriedade intelectual do editor e deve ser defendido a todo o custo. E não é só livros... música, cinema, jogos, software, artes plásticas, tudo deve estar incluído e valorizado.

A FNAC, com esta campanha de trocas, está pura e simplesmente a desvalorizar aquilo que tem nas suas prateleiras, a incitar o público à revenda num desprezo total pelas editoras, produtoras, estúdios e autores numa manobra de mediatismo e imediatismo fácil. Está a assassinar aquilo que é a base do seu negócio... ser a montra da propriedade intelectual, da cultura, do Autor, que deve ser pago por aquilo que produziu, pelo prazer que dá ao público com a sua obra. “Os Maias” estão para venda a €11.11. Como podem valer só €5?

É por isso FNAC se alguma vez te vir a passear no Chiado, atravesso a rua e dou-te um bom par de bengaladas. Está prometido!!

Comentários